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A Proposta Antropológica em Immanuel Kant e a Liberdade

        Kant no seu texto que responde à questão sobre O que é o Esclarecimento, demonstra 
nas entrelinhas sua concepção antropológica, sua relação íntima com a epistemologia, assim 
como fica subjacente os ideais que permearam o ambiente intelectual nos pensadores europeus 
da Ilustração. Primeiramente, é válido destacar que o espírito de época no período em que o 
filósofo prussiano elaborou seus escritos, é profundamente marcada pelo cogito cartesiano, 
pelas transformações sociopolíticas entre Igreja e Estado, a ascensão da burguesia, e por fim o
domínio técnico dos meios de produção; em suma, compreender o clima social vigente no 
século XVIII é fundamental para o entendimento acerca do pensamento sobre o homem em 
Kant e sua intrínseca relação com o saber.
        No Iluminismo, como Lima Vaz aponta, rompe completamente da concepção cristã 
sobre a condição humana: enquanto os cristãos através de seus preceitos teológicos, 
universalizavam o ser humano, tal qual afirma o apóstolo Paulo, unificados pela fé a totalidade 
dos cristãos tornam-se um aos olhos do Cristo; na “era das luzes” ao contrário, a 
individualidade é acentuada por intermédio do Esclarecimento, ou seja, o homem transformase realmente um a partir do momento que passa da Minoridade para Maioridade, dito de outro 
modo, quando desfaz das tiranias (dos sentidos e da religião) que limitam sua capacidade de 
pensar por si e eclode a verdadeira dignidade humana, a liberdade de pensar e agir em 
conformidade com a razão. Longe de ser mero individualismo, a perspectiva Iluminista de Kant 
dá ênfase ao papel fundamental que o “esclarecido” possui na sociedade: 


“O uso público de nossa razão deve a todo momento ser livre, e somente ele 
pode difundir o Esclarecimento entre os homens; [...] entendo por uso público 
de nossa razão o que fazemos enquanto sábios para o conjunto do público que lê.” (KANT, 1783)


        Visto que o indivíduo que alcançou a Maioridade possui a função social de despertar o 
povo para o conhecimento crítico, ou seja, a Liberdade adquirida da emancipação do jugo dos 
tutores que mantém a humanidade refém de suas interpretações, a antropologia kantiana 
assume uma compreensão pragmática do ser humano. No entanto, para o sujeito passar de seu 
estado de Minoridade para o Esclarecimento é necessário trilhar o itinerário da razão, o que, de 
acordo com Kant, é preciso alguns elementos fundamentais, tais como: ser do gênero 
masculino, sair da preguiça confortante de deixar terceirizar o pensamento a outros, vencer a 
covardia para assumir a “coragem de te servir de teu próprio entendimento, tal é, portanto, a
divisa do Esclarecimento.” (KANT, 1783).
        Levando em consideração que o fato de Esclarecer, em suma, é a autonomia do agir e 
pensar no indivíduo, a antropologia desenvolvida por Kant está estritamente conexa com seu 
entendimento de Liberdade. O homem só é livre, quando passa para a condição da Maioridade, 
como já dito, o progresso da Razão que eleva o indivíduo a vencer as falhas que o prendiam na 
externalização do pensar; conhecer é pensar por si, pensar só é Liberdade.





A Condição Humana em Blaise Pascal

No livro de Blaise Pascal Os Pensamentos (especialmente nos números 66 ao 72) é descrito a concepção de "ser humano" que está aí subjacente, tal concepção se torna possível tão somente no interior da Idade Moderna.

Nos trechos de Pascal é evidente a contraposição dialética em relação aos seus contemporâneos. Nos fragmentados registrados em seu livro Os Pensamentos, Pascal demonstra como o ser humano é um ser intermediário: nada em relação a infinitude; tudo em relação ao nada. O homem, de acordo com seus fragmentos, só poderia chegar a esta conclusão através do conhecimento de si, para reconhecer o quão grande é o ser humano por sua capacidade de pensar e do universo que o envolve para contemplar-se sua miséria por sua pequenez em relação ao todo e sua mortalidade que faz o homem assemelhar-se ao animal. Nesse sentido, Pascal vai estabelecer uma relação sintética quase dualista em relação ao ser humano: um milagre por sua grandeza e uma maldição por miserabilidade. 

Além do mais, Pascal recomenda que o ser humano considere a si próprio um ser estrangeiro na natureza, contemplando com espanto e admiração sua existência entre o abismo do infinito e do nada. O homem, portanto, caminha no meio termo nos mais amplos aspectos, o pensador francês demonstrará suas convicções a respeito em uma de suas principais obras: a racionalidade humana é capaz apenas de “alcançar o centro das coisas que abraçar-lhes a circunferência”; “limitados em tudo, esse termo médio entre dois extremos encontra-se todas as nossas forças”; “em suma, as coisas extremas são para nós como se não existissem, não estamos dentro de suas proporções: escapam-nos ou lhes-escapamos.” (PASCAL, 1973). O filósofo moderno, ao propor tais ideias sobre o homem, vai no caminho oposto da corrente filosófica que estava sendo consolidada após o declínio da Igreja de Roma. Pascal retira todo o brilhantismo que os pensadores renascentistas colocaram sob a humanidade, que de acordo com eles, o homem que é o ser mais digno e capaz de toda natureza, do mesmo modo contesta os pensadores que beberam da fonte cartesiana e criam na condição verdadeiramente dualista do sujeito, ou seja, partem da metafísica para a empiria, o ser humano só é porque pensa. 

Diferentemente de outros filósofos do início da era moderna que, influenciados pela concepção cartesiana do homem, acreditavam no “poder absoluto” da razão que poderia tudo conhecer, na superioridade que esta tinha em relação à sensibilidade, Blaise Pascal vai no caminho contrário aos “otimistas da razão”. Este afirmava que a razão é limitada, que vive em ilusões graças a inconstância permanente que há nas aparências, a razão, diversamente de Descartes, é objeto de dúvida para Pascal, nas palavras do autor em estudo: 

“Como poderia uma parte conhecer o todo? Mas a parte pode ter, pelo menos, a ambição de conhecer as partes, as quais cabem dentro de suas próprias proporções. Mas as partes do mundo têm todas tais relações e tal encadeamento uma com as outras que considero impossível compreender uma sem alcançar as outras, e sem penetrar o todo.” (PASCAL, 1973). 


Tendo em vista o pensamento de Pascal, tais concepções só foram possíveis ser concebidas no início da Idade Moderna. Após o enfraquecimento teológico-político do catolicismo apostólico romano, a Europa passou por uma ampla transformação: a burguesia começava a ascender; novas vertentes da religião cristã surgiam; o saber, graças as inovações tecnológicas e outras circunstâncias que possibilitaram, saíram dos mosteiros e pessoas que não pertenciam ao clero tinham acesso as obras do pensadores greco-romanos; dentre outros fatos que contribuíram para alterar o zeitgeist teocêntrico católico, em suma, pode-se afirmar que se iniciava um novo ciclo em solo europeu. 

Como já mencionado, Pascal vai se opor as concepções antropológicas contemporâneas à sua época e predecessoras de seu pensamento. Os renascentistas, anteriores à Pascal, maravilhados com as obras e sabedoria dos clássicos, construíram seu pensamento envolta da beleza humana que de tão demasiadamente humana se tornava divina (como fica evidente principalmente nas artes), ademais, o homem para os humanistas, é digno, é transformador e capaz por sua consciência; como Lima Vaz bem define os juízos que permearam o entendimento sobre a humanidade durante a Renascença, esta compreensão é: “[...] uma antropologia de ruptura e transição: ruptura com a imagem cristão-medieval do homem e transição para a imagem racionalista que dominará os séculos XVII e XVIII.” (LIMA VAZ, 1998, p.81). Já quanto aos seus contemporâneos, marcados pela concepção antropocêntrica renascentista e otimistas quanto a maestria da racionalidade, refinaram o entendimento dos pensadores humanistas, e acabaram por conceituar o homem sendo o que é graças sua capacidade pensante que duvida, na formulação cartesiana de Descartes, res cogitans. O racionalismo de inspiração cartesiana e a descobertas científicas ocorridas nesse período transformara em grande medida o pensamento filosófico moderno, influenciando vários pensadores modernos (como Hobbes, Locke, Espinosa, etc.) e que desaguara no Iluminismo.

Portanto, como fica evidente no decorrer trajetória do pensamento filosófico Ocidental, os fatos supracitados que envolviam o ambiente europeu na época que Pascal elaborou seus escritos, possibilitaram que o pensador francês formulasse sua filosofia e a condição que o homem possui. Contrapondo-se ao otimismo da razão e a exaltação da humanidade em pauta nesse momento histórico, Pascal se tornara um filósofo com um pensamento singular do início da Idade Moderna.







A Relação Existente Entre a Antropologia Cristã e Latina

    Nas parábolas elaboradas por Cristo, parece estar valorizada não só uma “natureza humana” – uma “essência” –, mas também e sobretudo a individualidade do ser humano, pela qual cada um é um ser único. Entretanto, não há nos Evangelhos a “ideia de pessoa”, utilizada só posteriormente na interpretação cristã de ser humano. Visto que não há uma conceituação de pessoa na Escritura, é possível estabelecer uma relação semelhante e conflituosa entre o entendimento bíblico e latino sobre o homem. 
 
    As parábolas em exame são respectivamente retiradas do Evangelho de Mateus (18, 12-14) e do Evangelho de Lucas (15, 8-10):

  1. “Que vos parece? Se um homem possui cem ovelhas e uma delas se extravia, não deixa ele as noventa e nove nos montes para ir à procura da extraviada? Se consegue achá-la, em verdade vos digo, terá maior alegria com ela do que com as noventa e nove que não se extraviaram. Assim também, não é da vontade de vosso Pai, que está nos céus, que um destes pequeninos se perca”
  2. “Ou qual a mulher que, tende dez dracmas e perder uma, não acende a lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente até encontrá-la? E encontrando-a, convoca as amigas e vizinhas, e diz: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a dracma que havia perdido!’ Eu vos digo que, do mesmo modo, há alegria diante dos anjos de Deus por um só pecador que se arrepende”.
 
    Nas parábolas narradas por Cristo no Evangelho de Lucas e Mateus, é perceptível por trás da linguagem metafórica, duas concepções antropológicas distintas que em seu agrupamento formam a base do entendimento cristão a respeito da natureza humana. Primeiramente, é válido ressaltar que o cristianismo não concebe uma essência humana a priori, mas sim situações existenciais; de tal maneira que sua “natureza” é de definida na ocasião que o homem se depara: de pecador ou filho de Deus. Em segundo lugar, é equitativamente importante compreender que ambas as situações existenciais não são dualistas ou contrárias, de modo que nas parábolas propostas a investigação e em demais passagens do Novo Testamento as duas situações em que o ser humano se encontra constituem a unidade da condição antropológica cristã: o pecador que precisa trilhar os passos do Nazareno, este que é o arquétipo, a “norma absoluta da concepção cristã do homem” (Lima Vaz, 2011, p. 61).
 
    A primeira situação existencial sobre o homem, herança dos predecessores do povo judeu, é descrita no mito da criação do capítulo segundo de Gênesis pela tradição javista, na qual o ser humano é pecador. No entanto, após a encarnação do Verbo, a perspectiva existencial que a humanidade se depara pode reverter-se seguindo o caminho de redenção que Jesus indicou, passando de uma existência pecaminosa para tornar-se filhos de Deus, desse modo, unidos pela fé não há mais distinção alguma entre os homens, pois todos os cristãos, de acordo com Paulo de Tarso, são apenas um aos olhos do Filho. Com efeito, as narrativas históricas traçadas no decorrer da Escritura é um reflexo que ocorre no interior do ser humano, ou seja, o indivíduo pecador que renasce pelo sangue derramado de Cristo; desse modo, a unidade da compreensão antropológica da tradição bíblica fica evidente no percurso delineado desde Gênesis até as cartas paulinas e dos demais apóstolos.
 
    Além do mais, tal qual a compreensão latina de persona, o entendimento cristão acerca da condição humana, traz o elemento da individualidade através da ótica soteriológica da existência. Toda pessoa, independentemente da situação existencial em que se encontra, é responsável por sua própria salvação (mesmo os que já renasceram em Cristo, nas palavras do apóstolo Paulo: “Portanto, aquele que julga estar em pé, tome cuidado para não cair.” - Rm 10, 12). Ninguém pode ser salvo pelo outro, nem sequer salvá-lo. A trajetória salvífica é de exclusividade única das decisões que o sujeito irá tomar no tempo fugaz que Deus lhe concede: viver segundo os ensinamentos de Jesus ou viver segundo os instintos egoístas. 
 
    Fora a semelhança do conceito de individualidade na concepção cristã e latina sobre o homem. Outro fato que ambos os entendimentos se encontram, em especial nas duas parábolas em estudo, é em uma das atribuições que os latinos designaram para persona, a posição social em que o indivíduo se encontra, no caso das narrativas de Cristo, o homem pequeno-médio produtor rural e a mulher plebeia. Ademais, é possível compreender outro aspecto que as condições antropológicas se entrelaçam, a saber, a mulher dona de casa responsável pelas finanças de casa e o pastor das ovelhas; dentre de outras particularidades que os latinos entendem que persona possui, uma delas é a profissão na qual o indivíduo exerce.
 
    Por mais que seja possível encontrar atributos semelhantes entre a antropologia cristã e latina, elas em suas respectivas bases, se divergem de forma contumaz uma com outra, especificamente do ponto de partida que partem. A situação antropológica concebida pela tradição cristã é essencialmente teológica, uma vez que a posição que o ser humano se encontra é uma relação intrínseca com o Criador. Já a antropologia que os latinos investigam é por sua vez filosófica, pois estes colocam o ser humano como centro de si mesmo em investigação, sem uma relação necessária com o divino ou com a pólis. 
 






RESUMO DE PSICOLOGIA SOCIAL: CONFORMIDADE E OBEDIÊNCIA

  1. Duas formas em que ocorre a conformidade segundo David G. Myers: A conformidade manifesta-se de inúmeras maneiras. David G. Myers, no...