SÍNTESE E PROBLEMATIZAÇÃO DO VALOR DA FILOSOFIA DE BERTRAND RUSSELL

    A reflexão do valor da filosofia perpassa o tempo e suas alternâncias. No mundo secularizado a questão toma proporções magnas e distintas mediante os desdobramentos próprios da passagem do período moderno ao contemporâneo. As reflexões acerca da problemática do papel do saber filosófico, do desenvolvimento das ciências exatas e naturais e do pensamento submetido a práxis capitalista ultrapassam os domínios herméticos dos intelectuais, resplandecendo em outras diversas manifestações culturais e no senso comum através da pergunta: Qual a utilidade e função da filosofia? Após os movimentos históricos do início do século XIX à contemporaneidade, a demarcação e limitação dos reinos dos diversos ramos do conhecimento tornou-se objeto de reflexão diante da ascensão de correntes filosóficas sistematizantes. As questões filosóficas direcionaram-se para a reflexão e enfrentamento ético, político e religioso na contemporaneidade. O ato de refletir sobre o “escândalo” da racionalidade contemplativa frente à prática, que rege a humanidade atualmente, é o pensar acerca das raízes e fundamentos da filosofia. 

    Russel coloca que o fundamento da filosofia é o pensar contemplativo que ascende à autonomia e à liberdade. A contemplação “neutra” do todo proporciona uma superação da alteridade, levando, consequentemente, a uma postura ético-política guiada por uma epistemologia abrangente e aberta à multiplicidade, — o Eu descobre o Não-Eu em um todo contemplativo. A filosofia não é dogmática, não possui verdades indubitáveis e leis no qual estrutura-se. Paradoxalmente, seu próprio valor encontra-se nesta incerteza e “imperfeição” ao não responder resolutamente seus problemas aporéticos. Nas aporias que o pensamento filosófico esforça-se para responder, a linguagem para compreender e interpretar o mundo se expande. O mundo, o Eu, ampliam-se com as suas questões sem respostas. 

    A perspectiva russeliana, ao contrário de seus contemporâneos analíticos, estabelece o seu domínio de pensamento contemplativo. Russel, aparentemente, retoma a noção do modo de pensar grego com as esperanças iluministas e idealistas (de Fichte e Schelling, especificamente). Com efeito, sua posição sobre o valor da filosofia é válida, mas não suficiente, diante da pressão que a sociedade tecnocrática estabelece para sua organização, porém encontra seu limite pelo mesmo motivo que é válida. Russel não apresenta em sua exortação à filosofia os impactos que a organização social exerce, influenciando e determinando o pensamento humano, ou seja, confere “[...] à educação um poder que ela não tem. Ela é apenas a imagem e o reflexo da sociedade. Ela a imita e a reproduz em tamanho reduzido; ela não a cria”. O pensar está sujeito à epocalidade do pensamento sob determinadas condições socioeconômicas, políticas e culturais. A contemplação, ainda que necessária na experiência fática de vida presente, é deslocada e impotente, pois “[...] não é com indivíduos isolados que se refaz a constituição moral dos povos”.




  • REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Russell, Bertrand. The Problems of Philosophy. Home University Library (1912). Oxford University Press, 1959. Reimpresso em 1971-2. Capítulo 15. Tradução de Jaimir Conte.
Durkheim, Émile. O suícidio: estudo de sociologia. São Paulo: Martins Fontes, 2019.


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