David Hume, em total contrapartida de Descartes e toda corrente racionalista, leva aos extremos o empirismo-cético inspirado nas ideias de Bacon, Berkeley e Locke. Em sua obra Investigações Sobre o Entendimento Humano e Sobre os Princípios da Moral, dentre outras várias outras questões que o filósofo britânico discorre, na segunda e terceira seção, irá expor seu parecer acerca da epistemologia e o modo que o conhecimento opera no homem.
Hume considera que todo o conhecimento parte da sensibilidade. O “eu” é fruto da totalidade dos fatos e operações cognitivas que elaboram o sujeito e seu respectivo conteúdo mental; não há, portanto, qualquer tipo de saber inato. Os fatos e as operações mentais sobre o mundo são percepções que o indivíduo sente ou pensa mediante as impressões que ocasionam as ideias, todavia, “essas faculdades podem imitar ou copiar as percepções dos sentidos, mas jamais podem atingir toda a força e vivacidade da experiência original” (HUME, 2004).
Sendo a mente um conjunto de percepções reproduzidas imperfeitamente por suas faculdades limitadas, o pensamento é reflexo copiador fiel dos fenômenos que reproduz uma imagem fraca da realidade empírica, Hume significando estas últimas, denomina-as como ideias provindas das impressões que, ao contrário, são vivazes e fortes. As impressões na terminologia huminiana correspondem a sensibilidade “crua”, isto é, as percepções que o homem experimenta no instante que as contempla, por exemplo: Deslumbrando o pôr-do-sol em uma praia de Maceió, as impressões que o sujeito vivencia neste instante são mais intensas e vigorosas em decorrência de seus sentidos; o indivíduo vê o sol se pondo, ouve o quebrar das ondas na areia, sente o vento fresco, o cheiro intenso do mar junto à costa e as gotículas de água que vem ao encontro de seu corpo, ele sente paz nesse momento em que exerce sua vontade de desfrutar suas férias no litoral.
Todas as impressões que o homem experimentou no exemplo acima, se transformam em ideias ou pensamentos quando resta apenas a lembrança da contemplação do entardecer em Alagoas, “[...] que são derivados da sensação externa ou interna, e à mente e à vontade compete misturar e compor esses materiais. Todas nossas ideias [...] são cópias de nossas impressões ou percepções mais vívidas.” (HUME, 2004).
Desse modo, compreendido como é estruturado o aparelho cognitivo do homem, Hume estabelece que absolutamente toda ideia que é elaborada por impressões que podem ser reduzidas a pensamentos simples que foram antes vivenciadas e sentidas em ato. Conforme mencionado no início da análise textual, toda ideia é uma cópia fraca mesmo quando de fato é experimentada, consequentemente, os pensamentos puramente abstratos são ainda mais deficientes e afastados da realidade, pois:
“O intelecto as apreende apenas precariamente, elas tendem a se confundir com outras ideias assemelhadas, e mesmo quando algum termo está desprovido de um significado preciso, somos levados a imaginar, quando o empregamos com frequência, que a ele corresponde uma ideia determinada.” (HUME, 2004, tópico IX, p. 39)
Em vista de tais fatos, fica evidente que há uma conexão entre os diversos pensamentos que originados, se combinam em respectivo método e continuidade. Hume exemplifica essa conexão por meio dos sonhos, em conformidade com o filósofo, a imaginação não gera nenhum conteúdo que não fosse previamente apreendido em vigília, mas dá frutos sim, ligando e fazendo conexões com diferentes impressões e ideias; ora, é impossível sonhar com uma cor que não exista no círculo cromático do mesmo modo que é utópico crer que há possibilidade de imaginar uma coloração que fuja dos matizes basilares. De acordo com o pensador empirista, eis que isso é “uma prova cabal de que as ideias simples, compreendidas nas ideias complexas, foram reunidas por algum princípio universal que exerceu igual influência em toda a humanidade” (HUME, 2004).
Essa conexão de ideias nasce de três princípios, semelhança, causa ou efeito, contiguidade no tempo ou espaço, exemplifica o autor, “[...] se pensarmos em um ferimento, dificilmente conseguiremos evitar uma reflexão sobre a dor que o acompanha.” (HUME, 2004). Neste exemplo em específico é possível aplicar os princípios supracitados com base nas próprias indicações posteriores de Hume. No que diz respeito à semelhança, indivíduo já foi ferido de algum modo (reflexão acerca do sofrimento); acerca da contiguidade no tempo ou espaço, é atribuído algum lugar e tempo para o ferimento (perna ou braço, se foi machucado agora ou há alguns dias etc.); por fim, sobre causa e efeito, alguma circunstância contundente proporcionou a lesão (um escorregão que esfolou o joelho.) Até mesmo as paixões e aptidões são vinculadas por meio da reflexão sobre um ferimento, por exemplo a repulsa e o ânimo para preservar a vida. Em suma, as informações idealizadas, sejam racionais ou passionais, são resultado da conexão pautada nestes princípios citados que fazem um processo da operação mental que transformam impressões em ideias simples para torná-las complexas.
Em síntese, fica evidente na análise da obra do pensador britânico que não há de forma alguma pensamento ou saber metafísico. Hume considera de forma contumaz o valor do conhecimento empírico, não há nada que esteja nada do indivíduo que antes não tenha passado pelo crivo da sensibilidade que, combinadas ou associadas de algum modo que torne as experiências parte da subjetividade de cada homem. Através de seu empirismo radical, o pensador espera com isso remover uma grande parcela da obscuridade que tanto se espalhou na história da filosofia.

Nenhum comentário:
Postar um comentário